Bolsonaro, ativismo e o trabalho de formiguinha

Não tem sido fácil ser formiguinha em tempos de Bolsonaro. É que as eleições deste ano no Brasil, principalmente para presidente, vieram carregadas de polarização extrema, muito discurso de ódio e as já famosas fake news. Quem acredita no diálogo, na cidadania ativa e nas pequenas ações transformadoras, como nós do Formiga-me, fica indignado (e triste) com o clima de violência que ganhou força nas últimas semanas.

Entre falas agressivas e preconceituosas, o candidato Jair Bolsonaro, líder nas pesquisas de intenção de votos, disse que vai colocar um “ponto final em todos os ativismos do Brasil” se for eleito. Em resposta, mais de 3 mil entidades, entre ONGs, coletivos e movimentos sociais, criaram o manifesto #AtivismoSim, disponível para assinatura online. Isso porque a gente precisa seguir em frente e, mais do que nunca, fazer valer a nossa liberdade de atuação. Mas muita gente também está desanimada, desesperada e querendo desistir.

Uns falam em sair do país, outros têm medo de andar na rua. Eu mesma tive pesadelos e algumas crises de raiva e tristeza. Isso sem contar as discussões com a família. A sensação que vem é de que somos pequenos demais e de que já perdemos tudo. Ao mesmo tempo, o trabalho de formiguinha nunca foi fácil. O ativismo, os projetos sociais e as campanhas de conscientização e educação sempre encontraram resistência por parte de quem duvida que dá para mudar e melhorar aos poucos.

Bolsonaro não vai acabar com o ativismo no Brasil! #AtivismoSim

Após saber de sua ida ao 2º turno da disputa presidencial, Jair Bolsonaro imediatamente proclamou que, se eleito, vai "botar um ponto final em todos os ativismos no Brasil". Mal sabe ele que somos muitos – e o nosso ativismo é o que constrói todos os dias um país mais humano, justo e igual. Ninguém vai nos impedir de fazer o bem. Assista ao vídeo e assine já o nosso manifesto para ficar por dentro do que você pode fazer para defender o ativismo no país: ativismosim.org #AtivismoSim 💪💪💪

Posted by AtivismoSim on Thursday, October 18, 2018

Bolsonaro e a formiguinha

Uma vez ouvi de um tio: “Muito legal isso que você faz de cuidar da praça. Mas ainda é só UMA praça em São Paulo, no meio de tantas outras abandonadas.” O que ele quis dizer é que o minha contribuição para o trabalho do coletivo Ocupe & Abrace, que transformou completamente a Praça da Nascente, na Pompeia, era pequeno demais para fazer alguma diferença. É como se fosse um esforço inútil, já que a cidade é tão maior que aquele espaço. E olha que essa praça em questão é a maior área verde do bairro!

Sim, somos pequenos, mas não insignificantes. O fato de não ser possível mudar toda a cidade de uma vez tem a ver com um limite óbvio, natural e humano, afinal. Claro que é impossível dar um passo maior do que a perna, com o perdão do clichê. Seria muita pretensão da minha parte, ou de qualquer um, querer transformar São Paulo. Mas se eu posso ajudar a transformar uma praça, dando passos menores que estão ao meu alcance, por que não?

A visão de que o pequeno não importa só faz sentido se acharmos que somos maiores do que realmente somos. Querer mudar o mundo de uma vez é a receita para frustração e desânimo. Precisamos entender e reconhecer os limites das nossas iniciativas, sabendo que a realidade é maior e mais complexa do que nós. Não vamos mudar o mundo sozinhos, porque cada um só pode fazer a sua parte. Agora, se perdermos o fôlego para fazer o que de fato está ao nosso alcance aí é que nada muda mesmo.

A formiga e o formigueiro

Fica mais fácil ser formiguinha quando usamos a pequenez a nosso favor. Quando ajustamos nossas expectativas para resultados menores e mais eficientes. Isto é, fazer o que a gente pode sem esperar que o resultado seja enorme e universal. Primeiro, porque é tudo o que podemos fazer mesmo. Segundo, porque toda ação tem o potencial de inspirar outras ações parecidas. É nisso que acreditamos aqui no Formiga-me.

Uma praça nunca é só uma praça. Acima de tudo, ela representa uma possibilidade para toda a cidade. Se cuidarmos de cada praça como se fosse a única, logo existirão outras praças sendo cuidadas. Uma formiga sozinha não vai longe, mas ela sempre faz parte de um formigueiro que potencializa e protege a sua pequena existência.

As discussões e desesperos que vivi e acompanhei nos últimos tempos me trouxeram uma lição: é preciso aprender a ser pequeno para ser maior. Sem esperar que o mundo mude é que a gente pode, de fato, mudar o mundo.

Mais do que escolher quem vai ser o nosso presidente, temos o grande desafio de entender o que está acontecendo e ver o que cada um pode fazer. Por exemplo, aprender a abrir o diálogo com quem está confuso e indeciso (comunicação não-violenta está aí para isso!), ou ainda fortalecer e apoiar projetos sociais e de ativismo.

Tudo isso faz parte de um processo longo, gradativo e, acima de tudo, coletivo. Ou seja, nada vai mudar nem agora nem de uma vez. Mas uma coisa é certa: os aprendizados, as aberturas para conversa e toda a experiência desse trabalho de formiguinha são conquistas que Bolsonaro nenhum pode tirar de nós.

 

Comentários
  • Denise Carpegiani
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    Quem trabalha com transformação, evolução, em qualquer âmbito, sabe bem que tudo o que você escreveu é uma realidade inevitável.
    Enquanto tivermos desejo de sermos melhor, temos a esperança de viver em um mundo melhor!
    Parabéns por estimular a reflexão filha 🙂

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